quinta-feira, 26 de março de 2009

Sem leites e limões!

Livre da cirurgia, o próximo passo da corrida maluca seria mergulhar nas profundezas obscuras do"liquido vermelho". Pelo menos era dessa forma que eu via o tratamento antes de ser diagnosticado. A imagem que eu tinha de pessoas que se tratam desse "monstrinho" era basicamente a do protagonista de 'Tudo por Amor'. Mas em uma das minhas idas ao instituto, eu conheci um paciente que tinha inúmeras características em comum comigo. Mesma idade, mesma doença, mesmos "brações" de tiranossauro, mesmo senso de humor. E nós havíamos sido operados no mesmo período, com a diferença de que ele já conhecia a quimioterapia por ter passado por algumas sessões antes da cirurgia. Sua descrição dos efeitos colaterais da quimio me deixou agradavelmente surpreso. Segundo ele, eu me sentiria cansado nos quatro dias seguintes à aplicação, teria algumas aftas na boca e, com sorte, nem perderia os cabelos (ela havia perdido os seus, mas não parecia abalado com o fato de estar careca e eu não tive tanta sorte também, pois até minhas sobrancelhas se foram! nossa, que feio eu fiquei... rs...). Um remédio chamado Nausedron resolveria o problema dos enjôos. A nutricionista aconselhou que ele evitasse frutas ácidas e laticínios durante o tratamento. Nada muito dramático, eu sobreviveria numa boa sem leite e limões por alguns meses. Fácil demais, eu deveria ter desconfiado.Na primeira consulta com o oncologista, ele garantiu que eu estava livre da radioterapia - não só na primeira, já que em todos os nossos encontros eu o fazia jurar que não precisava desse tratamento.
Minha pessoa seria submetida a oito sessões de quimioterapia, com intervalos de oito dias entre uma e outra. E quanto aos efeitos colaterais? "A medicina avançou bastante nessa área. Os remédios que amenizam os efeitos colaterais da quimioterapia são bastante eficazes. Você não vai sentir enjôos fortes, talvez um leve mal-estar". "Eu vou ficar careca?" perguntei, torcendo para ouvir algo parecido com "eu corto meu pinto fora se você ficar careca". Mas a resposta não foi tão animadora: "ainda não existem remédios que evitam a queda dos cabelos, mas algumas pessoas não ficam carecas durante o tratamento". Ok, eu tinha uma chance. "Maurício, você vai ter uma vida praticamente normal. Claro que se você tomar a quimio e comer uma feijoada em seguida pode sentir enjôo, mas fique tranqüilo. Você pode até tomar um choppinho com seus amigos de vez em quando. Lembre-se: vida normal". Marquei a primeira aplicação de quimioterapia para a semana seguinte e voltei para casa animado. Vida normal, certo? Pois hoje eu tenho uma palavra para definir essa história de ‘vida normal’: BULLSHIT.

As duas horas de aplicação na tarde da última sessão foram as mais longas de toda a história da humanidade. Quando a enfermeira finalmente retirou a agulha do cateter na minha mão, pude dizer em voz alta a palavra que ficou presa na garganta durante oito semanas. "Acabou". Pelo sorriso da enfermeira e do Júlio (muito obrigado, guri, por tudo!) pude perceber que eles entendiam a carga enorme de alívio que a palavra carregava. Olhei em volta e senti uma pontada de culpa por comemorar, mesmo que internamente, enquanto muitos pacientes davam os primeiros passos do tratamento.
Ontem a noite, enquanto tomava banho, tive uma crise de choro. Eu chorei muitas e muitas vezes durante todo o tratamento(escondido, claro), mas aquele era outro tipo de choro. Durante minutos, horas, sei lá, eu descarreguei todo o medo, as dores e os sustos pelos quais passei depois de descobrir o "monstrinho" que habitava em mim. Eu repetia ‘acabou, acabou, acabou’, tentando convencer a mim mesmo que o pesadelo havia ficado para trás. Mas no fundo eu sabia que só me convenceria disso depois dos efeitos colaterais. E os efeitos colaterais da última sessão de quimio não foram diferentes das anteriores. Tive fraqueza durante quase uma semana, teve barriga roxa de tanta injeção de filgrastima, teve dor quase insuportável na maxilar e no pescoço por três ou quatro dias. Até que, hoje, quando a Luzia jogou fora a seringa com a qual aplicou a última dose de Granulokine, eu respirei fundo e relaxei. "Agora, sim, ACABOU!".

Bem, tirando minha "família", somente o Elenilson a Meg e o Renato souberam do fato de forma mais intensa e precisa, pois não seria nada agradável carinhas de pena torcendo pelo meu fim nessa tragetória!
Se esconder? Disse a Meg. Foda-se! Faz o que vc achar melhor em relação a isso. tú não deve nada a ninguém mesmo... ! Sim, eu não devo nada a ninguém e chamem do que quiser. Exposição, impulso e o caralho a quatro. Tudo bem, o blog talvez não seja o melhor lugar para se contar isso, mas se não fosse aqui, onde seria? Num livro? Nem pensar! Eu não teria saco!
Enfim, como diria Dr. Mário... "vida normal"! Aceitam uma cerveja (sem alcool)? não? thanks.



PS: Obrigado de coração (e especial) ao pessoal da enfermaria, ao Júlio, pelas sobremesas "sequestradas" do refeitório e pela paciencia comigo. Obrigado a Dete e a Rose por serem rápidas no vasilhame para encher com meu vômito desesperado. Um muito obrigado especial ao Elenilson Nascimento, que me adotou nessas semanas "intermináveis, ao Rê, mais uma vez pela paciencia, a Meg, ao Pedro, que insistentemente invadiu minha área (bendita hora) e me surpreendeu por demais e aos meus caninos amados que pareciam entender toda a parada que acontecia. Obrigado a todos aqueles que estiveram comigo e um muito obrigado a quem fez questão de desaparecer na hora em que eu mais precisei!
Para aqueles que torceram para o fim do Maurício Zerk, uma boa viagem nesta vida louca e muito amada por mim!

E só para não esquecer: Pai, EU TE AMO!


(Pois é, eu ainda acredito no amor!)

2 comentários:

Sentimentos Sombrios disse...

Não agradeça! Aceito o pagamento com um porre, muita conversa e risadas intermináveis!!!!!!!!!!

Louise

Maurício Zerk disse...

ehehehehe...nem fala em porre, pois hj eu tomei umas 10 sozinho! ops, acho que me entreguei! ahahahahahaha...
bjão, garoto!

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