sexta-feira, 27 de junho de 2008

Coisas inesquecíveis!!!


Quando cheguei, era madrugada. Tinha percorrido 1.200 km entre sonhos, vontades e lembranças de decepções. Entre a hora que o telefone tocou avisando, e aquele momento em que entrei no salão fracamente iluminado, quinze longas horas haviam transcorrido. Então pude vê-lo...com o corpo envolvido num tecido branco, enrolado em faixas.
Suavemente depositado na pedra fria do mármore, enquanto à sua volta, guardando alguma distância, cadeiras encostadas na parede abrigavam os amigos e parentes que atravessavam a madrugada esperando a hora derradeira chegar.
Aproximei-me devagar, como se minha presença pudesse despertá-lo do sono. Eterno. Minha chegada, tantas vezes antes, tinha o dom de agitá-lo. Mas não naquele dia. Encontrá-lo ali, inerte, com a expressão límpida, e serena de quem apenas dormia era estranho demais.
Não consegui ouvir direito as pessoas ao meu redor. Os cumprimentos, as perguntas. Por que não vieram antes? Não sabia que ele estava doente, há mais de uma semana no hospital? Não. Eu não sabia. Ninguém me disse nada. Nenhum telefonema. E ele, por orgulho ou esperança, não tinha mandado avisar. Nós – cuja capacidade telepática de enviar sinais atravessava os mares – tínhamos partido um do outro sem despedida, sem lágrimas.
Procurei não pensar nos seus últimos momentos, antes da hora definitiva do coração parar. Me angustiava imaginar que ele sofresse de saudade, que ele se encontrasse solitário, que ele pudesse ter pensando onde errou para estar assim, longe dos que mais amava na hora da extrema fragilidade.
Sentei-me alguns minutos depois da chegada, após trocar meia dúzia de palavras obrigatórias com os parentes. E de lá, da cadeira distante onde estava, fitava seu rosto e falava com ele. Naquela hora, juro que acreditei que ele também estivesse alí, e podendo me ouvir, agora em pensamento, como tantas vezes antes. Então me pus a conversar,e a lhe pedir calma nesta hora. E a dizer o quanto o amava. Tantas demonstrações disso eu havia lhe dado em vida, que esperava seu perdão pelos últimos três meses de distância.
Horas se passaram enquanto de longe eu escutava notícias de seus últimos dias. Cortantes vozes que me diziam como ele me esperara para o ano novo. E de quanto ele esperara que eu ligasse depois, quando o quadro clínico piorou. E de tudo que havia preparado para me receber. Nada disso adiantou. Minha passagem aérea, marcada para quatro dias depois, nunca foi usada. Era tarde demais. Quando seu corpo desceu para a terra, eram mais de nove horas do dia seguinte. E estranhamente as lágrimas haviam cristalizado dentro de mim.
Esta noite sonhei com ele. Já fazem mais de três anos da sua partida. Foi um sonho estranho, em que eu me via num grande mercado, falando ao telefone e ele passava por mim. Estava tão bonito, bem vestido, alinhado. Sua calça de corte fino, e a camisa de linho azul clara, de mangas longas estavam impecáveis. O rosto estava sereno e ele me olhava com simpatia. Apressei o fim da conversa para alcançá-lo. Desliguei e desci as escadas. Mas ele já havia partido. Como naquele dia, antes que eu pudesse chegar. Mas esta noite eu chorei, copiosamente. Quanta saudade de vc Flávio,que aprendeu a me suportar e conseguia ver o que existe de bom por aqui,que me conhecia de dentro pra fora!Quanta saudade de vc!!!

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